quarta-feira, 31 de março de 2010

Núcleo internacional



Depois da reforma da Saúde, será que a reforma dos sistema financeiro sairá?


A reforma da saúde é lei. A seguir: reforma financeira. Mas ela acontecerá? A Casa Branca está otimista, porque acredita que os republicanos não vão querer ser vistos como aliados de Wall Street. Eu não estou tão certo. A pergunta chave é quantos senadores acreditam que podem escapar impunes alegando que guerra é paz, escravidão é liberdade e regulamentação dos grandes bancos significa fazer um grande favor aos grandes bancos. Um pouco de história: nós costumávamos ter um sistema viável para evitar crises financeiras, apoiado em uma combinação de garantias do governo e regulamentação. De um lado, os depósitos bancários eram segurados, impedindo as grandes corridas aos bancos que foram a causa central da Grande Depressão. Do outro, os bancos eram fortemente regulamentados, para que não tirassem proveito das garantias do governo correndo riscos excessivos. De 1980 em diante, entretanto, esse sistema gradualmente ruiu, em parte devido à desregulamentação bancária, mas principalmente por causa da ascensão do sistema bancário “paralelo”. (...) O resultado, em 2007, foi um sistema financeiro tão vulnerável a crises severas quanto o sistema de 1930. E veio a crise. E agora? Nós já recriamos, na prática, garantias do tipo New Deal: quando o sistema financeiro mergulhou na crise, o governo interveio para resgatar as empresas financeiras em risco, para evitar um colapso completo. E é preciso ter em mente que os maiores resgates ocorreram sob um governo republicano conservador, que alegava acreditar profundamente no livre mercado. Há todo motivo para acreditar que essa será a regra daqui em diante: na hora do vamos ver, independente de quem esteja no poder, o setor financeiro será resgatado. Na prática, as dívidas dos bancos paralelos, como os depósitos dos bancos convencionais, agora são garantidas pelo governo. A única dúvida agora é se o setor financeiro pagará um preço por este privilégio, se Wall Street será obrigada a se comportar de forma responsável em troca do apoio do governo. E quem poderia ser contra isso?

A única pergunta é se vamos regulamentar os banqueiros para que não abusem do privilégio da ajuda do governo. E é essa regulamentação –não futuros resgates– que os oponentes da reforma estão tentando bloquear.

Paul Krugman
Professor de Princeton e colunista do New York Times desde 1999, Krugman venceu o prêmio Nobel de economia em 2008

6 comentários:

douglas da mata disse...

Como diz um texto da The Economist, publicado em suplemento especial na Carta Capital:

"Precisamos salvar os financistas deles mesmos".

Um abraço

Gustavo Carvalho disse...

Menino Douglas, o mais grave do argumento do Krugman é que a própria racionalidade sistêmica pressupõe o socorro aos homo economicus irresponsáveis. Portanto, a ação política fica prisioneira dessa lógica do capitalismo pós-industrial... Vide Obama que além de assumir o onûs eleitoral de salvar o sistema financeiro causador da crise tem que neutralizar a má-fé militante da direta!
Abç

douglas da mata disse...

Mas essa lógica de Krugman deve estar limitada.

É claro que não podemos usar a anti-democracia aos inimigos da democracia, a anti-política contra os anti-políticos, e por aí vai.

mas há hiatos institucionais, pós-rupturas que necessitam medidas de exceção.

ou seja: tem determinados momentos, que é preciso cortar algumas cabeças, para o bem do resto do corpo da hydra!

o desafio é calibrar a munição para não atingir mais que o alvo pretendido.

um abraço, ancião gustavo.

Gustavo Carvalho disse...

Acho que no caso de Obama o processo foi ao contrário, pois ele só venceu os republicanos na arena parlamentar quando mostrou o porrete a partiu para cima. Quando ele estava calibrando muito os tiros, e apenas posando de estadista, ficou tão enfraquecido que nem no partido democrata tinha votos suficientes! Mas em muitos eventos da vida política a sua recomendação demonstra-se válida: menos é mais! Nas entidades mitológicas há sempre espaço para um evento deus ex machina que sutura e sublima as feridas trágicas ...
Obs.: obrigado pelo ancião!

Anônimo disse...

AH! Queria este ancião para me fazer companhia!

douglas da mata disse...

É verdade, ancião.

A decisão foi um racha histórico, que demarcou profundamente a cisão democrática nos EEUU.

Pela primeira vez uma votação dessa envergadura foi aprovada sem NENHUM voto do lado contrário, apesar de estar toda deformada.

Quanto a meu lado, eu tenho uma tendência a adotar essas "medidas de emergência". rsrs.

um abraço, ancião!